Ainda Escuto Álbuns #1: BACO VIVE! BLUESMAN é um grito do povo negro!

Baco Exu do Blues ou Kayne West da Bahia ou Bluesman, o baiano de apenas 22 anos quebra de esteriótipos e traz mensagem em seu novo disco. (Foto: Divulgação/Alex Takaki) 

*Com colaboração de Jonas Sakamoto

Baco Exu do Blues é como se apresenta ao público um rapaz jovem (22 anos!) chamado Diogo Moncorvo, rapper baiano que pode ser considerado um fenômeno, não só no que diz respeito à sua genialidade lírica, mas, também, quanto ao crescimento da sua carreira. 

O primeiro álbum foi lançado no ano passado, intitulado Esú (2017), que teve o single “Te Amo Disgraça” estourando em todos os lugares e ganhando o Prêmio Multishow de Canção do Ano.

Já este ano, os “premiados” fomos nós: ganhamos de presente de Natal [antecipado] o novo disco do rapper, chamado Bluesman — e a euforia não tem sido pouca com esse trabalho.

A primeira grande aparição do Baco foi em 2016, com a música Sulicídio, uma crítica ácida e bastante agressiva sobre a concentração das atenções à cena musical do rap na região Sudeste. Baco, embora bem jovem, já explicou que não canta mais esta música pois usou alguns termos ofensivos que prefere não repetir  — putz! Já começou bem: se retratar é uma virtude! 

BLUESMAN

Cada faixa de Bluesman tem uma explicação que Baco fez questão de dar ao fãs nas redes sociais. Além disso, cada música é representada por uma fotografia de Helen Salomão, baiana (como Baco) que tem um trabalho de extrema sensibilidade voltado, principalmente, para a estética e diversidade do corpo negro, resultando em um grito imagético político forte (já entrevistamos ela uma vez aqui no SobreOTatame, clique aqui e relembre!).

Uma pegada que Baco soube aliar ao seu novo álbum, que também é um grito, um pedido de ajuda trazendo à tona questões de saúde mental relacionadas ao racismo, desigualdade social e às exigências do mercado musical.

https://www.instagram.com/p/BqPgOoGF6ML/

No seu instagram, o artista admite:

Esse disco sou eu me lembrando todo dia que eu não to bem e que eu preciso me cuidar (sic)

Quem é o Bluesman?

O álbum inicia com uma voz forte e grave explicando o que é o Bluesman, o indivíduo negro que não se encaixa no que lhe é imposto e perdido e que, portanto, se coloca contra a maré fazendo seu próprio caminho. Não precisa então, tocar blues para ser um Bluesman.

O blues é um ritmo forte, sensual e que na sua existência sempre foi sinônimo de resistência para o povo negro. Vozes como a de Big Mama Thornton, John Lee Hooker, Muddy Watters e BB King (que inclusive é homenageado por Baco dando o título à canção que fecha o disco com chave de ouro) cantaram as mazelas do racismo, do segregacionismo e da pobreza juntamente com as vivências de sentimentos como raiva, paixão, vingança, fé, relações tumultuosas e o próprio sexo.

Todos estes mesmos componentes estão no trabalho de Baco Exu do Blues, mostrando que o Rap nunca foi tão blues no Brasil e que “do Blues” não está no seu nome à toa. Jesus é Blues: ao falar que tudo que quando era preto era do demônio e depois virou branco e foi aceito“, Baco começa a chamar de blues, relembrando as raízes desse ritmo.

Além dos diversos dilemas psicológicos trazidos à tona no álbum — suicídio, depressão e co-dependência afetiva (situações até “comuns” nesta geração) são bem nítidos em Queima minha Pele — Baco continua, também, com a sensualidade e a malícia aliada a sentimentos fortes ora problemáticos ora libertadores em uma relação que aparecem em Flamingos e Me Desculpa Jay Z.

A idade de Baco não consegue ser disfarçada nas músicas, vários nomes citados são referências bastante atuais (inclusive Britney, pirando em 2007 expondo a dificuldade de ter sido uma jovem o tempo todo cercada pela fama — experiência vivida agora mais recentemente por Baco e que ele também expõe desde Esú), e mesmo assim é impossível não afirmar que o rapaz é incrível e uma promessa bem viva para os próximos anos — como ele mesmo diz na primeira faixa, Baco é o maior inimigo do impossível.

Entre tantos lançamentos este ano, sem sombra de dúvida Bluesman é um dos grandes.  As participações do álbum, também, são de pessoas que estão ganhando espaço no cenário musical atual, como Tuyo (banda composta por três membros negros e que propõem as mesmas discussões nas redes sociais) e Tim Bernardes (vocalista de O Terno e filho de Maurício Pereira).

Fazia um tempinho que um rapper não movimentava tanto o público como dessa forma. Criolo e Emicida, estiveram bem presentes nos últimos anos, Marcelo D2 lançou recentemente “AMAR é para os FORTES” e Baco ainda estourou mais — antes talvez Sabotage com “O Rap é Compromisso” foi o que mais causou um barulho maior.  Baco, com dois trabalhos seguidos, está conquistando o seu espaço sem deixar dúvidas sobre o seu talento. O som diz a que veio e é um protesto de uma geração criativa e atenta às suas circunstâncias: é visceral, real, crítico e agora, mais que tudo, político.

Na moral, Baco ainda vai longe! 

Bluesman: O Filme

Baco se preparou de várias maneiras para o lançamento do seu segundo disco, além das fotografias, parcerias, contextualizações e participações especiais no álbum, ele trouxe ao mundo um vídeo que sintetiza bem o que o álbum representa. Bluesman (Filme Oficial) é um daqueles materiais que é uma obra prima.

Abrindo com um garoto contando como vive sua infância e ao final falando de seu sonho futuro, Baco traz o primeiro soco quando a criança fala que quer ser médico quando crescer. Seguindo por um jovem correndo pelas ruas indo ao encontro de um senhor, após isso, um homem explica o valor da prata e comparação com um ouro e apresenta um argumento acerca da população negra ser maioria no país e a minoria que é valorizada.

Em seguida, o vídeo traz uma sequência de incríveis imagens que retratam famílias, religião, arte, rua e sensibilidade ao abordar todo o universo de luta, perseverança e ancestralidade que o povo negro possui.

A produção é de uma beleza praticamente impecável. Desde a fotografia, montagem, narrativa, as cores e como é construída uma narrativa entrelaçando algumas músicas do álbum com o significado do “Bluesman” que explicamos acima.

Arrisco a dizer que muito fã de rap e da cultura hip hop irá substituir as correntes de ouro por prata devido a simbologia e representatividade abordada neste filme.

SÓ PRA LEMBRAR:

Bem aqui ao nosso lado, em Teresina, nossa irmã nordestina, vai rolar, no dia 8/12, a 3ª edição do Dope Festival, o maior festival de Hip-Hop e Cultura Urbana do Nordeste, que terá como principais atrações da noite, APENAS, BK e BACO EXU DO BLUES. 

Segue o Instagram do Dope e acompanha as novidades: @dopefestival.the.

https://www.instagram.com/p/BqkcKDmHG3h/

O SobreOTatame estará no Festival e vocês poderão acompanhar tudo pelos nossos stories no Instagram. Segue a gente também pra ficar por dentro: @sobreotatame.

Steffi de Castro é psicóloga. Atua em São Luís como designer instrucional e escritora. É redatora no SobreOTatame, escreve e estuda sobre música, feminismo e comportamento. É estudante de tarô, dançarina amadora, podcaster, adora ASMR e a vida offline.

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