Se pudéssemos definir depressão de um modo simples e pragmático, utilizaríamos o conceito de vitalidade, no caso, a falta dela. Vitalidade é vigor, impulso e vontade de viver, o oposto disso é o embotamento profundo, a apatia, a escassez do desejo de estar vivo.
O conceito não é simples – cada pessoa é um mundo (ou um universo) –, a vivência é complexa e entender é muito importante. Imagine que você tem uma vida típica: trabalho, amigos, vida social ativa, relacionamentos estáveis e afins, ou seja, navega o mar calmo da “estabilidade” emocional. Agora tente imaginar esse barco virando aos poucos e que há um oceano inteiro tentando te engolir, levando teu fôlego, te empurrando para o fundo e você nunca aprendeu a nadar, a água entrando pelos pulmões dói muito, os braços vão ficando cansados e viver começa a ser difícil – a dor de viver, de fora pra dentro, de dentro pra fora!
Angustiante, não? É mais ou menos por aí que funciona a depressão.
Há um estigma sobre a palavra que dificulta muito na busca por auxilio, sempre existe aquele que vai chamar a tristeza profunda do outro de frescura, carência, falta disso ou daquilo. Por favor, não seja essa pessoa! A OMS estima que, no Brasil, cerca de 5,8% da população sofra de depressão, são 11,5 milhões de pessoas em sofrimento psíquico, não podemos dizer que milhões de pessoas sofram de “frescura”.
Nós, do Sobre o Tatame, estamos sempre buscando modos de influenciar positivamente. Pensando em trazer um pouco mais de luz a questão, conversamos a respeito do assunto com o psiquiatra Tiago Arruda Ribeiro, ludovicense e formado pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), foi residente em psiquiatria pela CHPB/FHEMIG em Barbacena, em Minas Gerais.
SoT – Ainda é comum ouvir pessoas minimizarem quadros depressivos, ou por não entenderem ou por acharem que é “frescura” de quem está em sofrimento, podemos começar esclarecendo, o que é depressão e quais são seus sintomas mais comuns?
Tiago Arruda: Devemos deixar bem claro que a depressão é uma doença, como a própria “tristeza patológica” resumiriam alguns. Transtorno mental grave e potencialmente fatal, uma das principais causas de incapacidade ao trabalho no Brasil e no mundo, os pacientes atingidos pelas formas mais graves podem falecer em razão de suicídio ou por interrupção da ingestão (inanição e desidratação). Os principais sintomas são: tristeza, falta de ânimo ou vontade de realizar as atividades, dificuldade de sentir prazer, falta de energia, baixa autoestima, pessimismo em relação ao futuro, alterações no sono e apetite, sentimentos de culpa e dificuldades de concentração.
SoT – Há uma diferença entre estar depressivo e estar melancólico, qual a correlação dos dois estados afetivos?
Tiago Arruda: Precisamos diferenciar a tristeza normal da depressão enquanto doença (transtorno depressivo maior). A tristeza é um afeto dado em resposta a um acontecimento externo ou interno, ou seja, se algo ruim ocorre na sua vida, é normal que você fique triste por pouco tempo. Porém, na depressão ocorre rebaixamento do humor, o “colorido da vida” fica persistentemente acinzentado. Explicando melhor: pessoas com depressão não conseguem escapar de seu estado de tristeza profunda, desânimo, cansaço e lentidão mesmo que “coisas alegres” aconteçam em suas vidas.
SoT – Fala-se muito que a Depressão é a doença do mundo moderno, por sermos essa geração de excessos – sempre com demandas extras, expectativas internas e externas, relacionamentos complicados, família e vida profissional –, isso faz com que estejamos mais propensos ao sofrimento?
Tiago Arruda: O século XXI tem sido associado a uma explosão de novos casos de transtornos mentais, principalmente depressão e transtornos de ansiedade. Caso isso seja verdade, só podemos especular sobre os motivos. Penso que na nossa sociedade consumista, a mídia precisa propagar a ideia do “mais bonito, mais rico etc” para gerar capital. Entretanto, a felicidade, me parece, está mais ligada a contentamento. Talvez ainda exista uma grande distância entre o que a nossa sociedade diz ser o caminho para a felicidade e o verdadeiro caminho para gostarmos de nós mesmos e das nossas vidas. Possivelmente, esse é um dos motivos para as pessoas sentirem tanta frustração e mal-estar.
SoT – Jovens e Adolescentes são consumidores massivos de informações e as redes sociais são os maiores portais de acesso, com isso há uma influência sobre o comportamento e o modo de se relacionar com o mundo, pode-se pensar nisso como um possível agravante para evolução de quadros de ansiedade até a depressão?
Tiago Arruda: As redes sociais podem ser uma influência positiva ou negativa sobre as pessoas, depende da forma como são utilizadas. Recentemente, um estudo realizado no Reino Unido constatou que o Instagram é a mídia social que causa mais danos mentais a pessoas entre 14 e 24 anos, deixando os participantes depressivos, ansiosos e com isolamento social. Os autores do estudo acreditam que, ao ver tantas fotos de pessoas bonitas (muitas fakes ou manipuladas em Photoshop), os jovens da amostra se sentiam incomparavelmente feios e inadequados. Há outros problemas envolvendo saúde mental.
Estamos recebendo em nossos consultórios pais com seus filhos adolescentes (ou mesmo crianças) exigindo uma solução, pois eles estão “viciados” em redes sociais. Se recusam a brincar, praticar esportes e até mesmo dormir porque ficam conectados o tempo inteiro. Até na sala de aula o professor é totalmente ignorado; jovens se aproveitam do aparente anonimato para realizar Cyberbullying e até crimes. Acho que estamos falando de uma problemática muito complexa e atual que precisa ser discutida seriamente com a sociedade.
SoT – A depressão quando não tratada com a devida importância pode levar ao suicídio, como isso pode ser prevenido? Quais os tratamentos indicados para casos depressivos?
Tiago Arruda: A prevenção ao suicídio envolve o diagnóstico e tratamento da depressão e também a avaliação do risco suicida. O diagnóstico de depressão deve ser feito por um médico. O tratamento da depressão normalmente envolve o uso de medicamentos – fármacos antidepressivos –, e tratamento psicológico. Em casos mais graves, o tratamento pode envolver internações integrais ou semi-internações, em razão do elevado risco suicida ou outros problemas clínicos e sociais. Cabe o alerta: infelizmente, em razão de preconceito, muitas pessoas não fazem tratamento contra a depressão ou estimulam seus parentes a não fazê-lo. Ocorre o agravamento da depressão e em seguida o suicídio.
SoT – Por fim, fala-se muito em oferecer uma escuta melhor quando se percebe que alguém está entrando em um quadro depressivo, como realmente é possível ajudar?
Tiago Arruda: Você acha que conhece alguém com depressão, mas não tem certeza? Além dos sintomas citados, depressão representa perda de funções. O deprimido tem que trancar a faculdade porque não consegue responder às provas, é demitido do trabalho porque perdeu eficiência, não consegue mais ser o bom marido, bom pai, bom amigo que era antes. Uma vez que você desconfia que um conhecido seu está deprimido, você pode ajudá-lo aconselhando-o a procurar um médico. Caso ele não queira ir ao psiquiatra em razão do estigma e preconceito associados à psiquiatria, recomende que ele comece procurando um clínico-geral.
Esperamos ter ajudado na elucidação de algumas questões sobre o assunto e ressalvamos que o compromisso de se importar com a nossa saúde mental é imprescindível para que tenhamos o mínimo de qualidade de vida. E a maior lição é: ao ver o outro sofrendo, não minimize aquela dor, seja empático, é um exercício diário!
Nota do editor¹: As fotos que ilustram a entrevista é de um jovem fotógrafo norte-americano chamado Edward Honaker, ele tem apenas 21 anos de idade e foi diagnosticado com depressão e ansiedade. Através de suas fotos, ele expressa como uma pessoa que sofre com esses males vê o mundo e, também, é uma forma dele aliviar suas angústias.
Nota do editor²: Há alguns meses atrás, realizamos uma entrevista divida em duas partes com a psicóloga Mae Soares com a temática Ansiedade, caso você tenha interesse e dúvidas sobre o assunto, veja os vídeos abaixo:
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