Fiquei feliz quando fui convidado para trocar essa ideia com o MC Alcino e preparar um material para o Especial TEDx Rua Portugal aqui no Sobre o Tatame. Já esperava encontrar um cara do bem, altruísta e com uma história de vida que serve de exemplo pra muita gente, mas encontrei muito mais. Os poucos minutos que tivemos de conversa foram uma aula de humanidade e lucidez. MC Alcino é intenso. Papo reto! Verdadeiro. Só fiz algumas perguntas, foi bem rápido, ele tem discurso pronto, não porque decorou, mas por falar o que sente.
Nascer na periferia de São Luís, crescer em meio à pobreza e ao crime, conseguir se reerguer – após mergulhar de cabeça no submundo de uma das áreas mais violentas da cidade -, e virar referência para sua comunidade é a credencial desse artista que, além de rapper, é ativista social e cineasta. MC Alcino usa o microfone pra fazer rap, mas canta e discursa com o coração. A arte e o ativismo desse cara tem ajudado muita gente. Ouvi-lo é um empurrão para muitas reflexões. O cara vai tá lá no TEDx. Vai ser foda! E, antes de sua palestra no evento, ele me deu a honra desse bate papo. Saca aí:
Sobre O Tatame – O que o MC Alcino pretende passar para as pessoas nesta palestra?
MC Alcino – “Passar que a gente pode transformar a vida das pessoas. O mundo pode ser muito melhor se nós olharmos para o próximo com mais amor. Temos que ter a sensibilidade de perceber que podemos contribuir de alguma forma. O que ajudou o Brasil chegar ao nível de violência que estamos foi justamente o egoísmo de cada um, saca? Tipo assim: ‘ah, tá morrendo uma galera, mas é dentro da favela então eu não me importo’. Mas, quando as drogas e a violência chegaram ao asfalto a coisa mudou. Passou a virar preocupação, pois passou a atingir a todos. Então, eu acho que se todo mundo passasse a se preocupar também com o problema do próximo o mundo será bem melhor, bem mais justo. É isso”.
Sobre O Tatame – O que você conversa com esses jovens nos shows? Nas penitenciárias? Nos projetos socais que tu visita? E com a rapaziada aí do teu bairro?
MC Alcino – “O que eu ouvi do meu pai e do Roberto (veja a história do MC Alcino contada no programa do Fantástico), que foram cruciais para a minha mudança, eu utilizo muito. O que mais falo é que nunca é tarde. Quando vou às penitenciárias sempre estou falando isso para os caras. Nunca é tarde pra recomeçar. Há uns três dias eu encontrei um cara que tinha tudo e perdeu tudo por causa das drogas. Ele se recuperou, mas voltou a perder para o vício. Falei pra ele: ‘tem que recomeçar’, daí ele falou: ‘mas eu tenho até vergonha’, e eu voltei a dizer: ‘recomeçar é da hora. Tem que tentar’. Hoje ele fala que eu fui o único que acreditou nele. Cara, você tem que ser o primeiro a acreditar em você mesmo. Não importa se você é negro, feio, tem o narigão, tem a orelhona, você tem que ser o primeiro a se achar bonito. Cada um tem que acreditar no seu sonho. Porque pra destruir com palavras negativas você encontra vários. Eu mesmo passo por isso diariamente. Todo mundo passa por isso. E a saída é essa, acreditar em você”.
Sobre O Tatame– Como que é a vida de um cara que quase ninguém queria chegar perto por ser muito violento e hoje é até chamado pra dar palestra em um TEDx? Sobe em palcos, é chamado para dar entrevistas. O que mudou na sua relação com as pessoas?
MC Alcino – “Vou ser bem sincero, como eu costumo ser. Acho que a sociedade é muito hipócrita. Eu chego em um lugar todo mundo quer conversar, dar atenção. Mas isso não tem que ser só comigo. Mas com todos. Recentemente, fui convidado para tocar em um bloco de carnaval no meu bairro e pude ver como é isso. As pessoas queriam tocar, abraçar, chegar mais perto, e eu gosto disso, mas sempre foi assim. Em todo lugar que vou eu gosto de sentir o calor humano. Conversar com as pessoas. Eu amo os guri. Adoro reunir criança que ninguém dá atenção, chamar para jogar uma bola. Alugo um campo. Sempre fiz isso. Isso está em mim. Eu colo com os alcoólatras, quando eu passo pela feira eles me chamam, eu fico lá. E me sinto bem. O amor que emana daqueles caras já existia. É Natural. Nasceu antes do MC Alcino. É Verdadeiro”.
MC Alcino “Fora da Zona de Conforto”
Sobre O Tatame – Então algumas relações lhe incomodam?
MC Alcino – “Para você ter uma ideia, quando eu chamava um colega meu na sua casa, a mãe logo falava: ‘Tá andando com Alcino? eu não quero esse cara por aqui’. Eu cansei de ser humilhado. Por que não me chamavam para dar um conselho? Falar que eu estava indo para o caminho errado!. Me convidar para entrar!. Será que a minha vida não seria transformada há muito tempo atrás? É muito fácil dar tapas nas costas de quem tá por cima. Outro dia eu estava na pizzaria com um amigo que recusou a companhia do seu próprio irmão por este ser um viciado em drogas. Falei pra ele: ‘Cara, isso não pode ser assim’. Chamei o rapaz, ele comeu uma pizza com a gente. Conversou. Estava molhado, descalço, mas se sentiu bem. Naquele momento eu não estava nem aí para o que as pessoas estavam pensando. É dessa atenção que eu estou falando. As pessoas precisam disso”.
Sobre O Tatame – Como é dar essa atenção para pessoas que ainda estão no mundo do crime?
MC Alcino – “Na cadeia as pessoas acham que só tem monstros e eu me sinto bem pra caramba. Há uns 15 dias eu fui cantar na FEBEM [Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor] e resolvi levar a minha esposa. Pra ela ver que aqueles caras que ele tem medo são seres humanos. Eles abraçaram ela, pediram pra bater foto com a gente. Se sentiram amados. Abraçados. Isso é amor, cara!. Poxa, eu fui lá cantar de graça. É disso que estou falando. São essas pessoas que precisam. Hoje em dia eu não compro roupa, sempre ganho, mas quando eu mais precisava ninguém me dava. Pra você ver como são as coisas. Não pode ser assim”.
MC Alcino durante visita a uma cadeia de São Luís
O MC Alcino será um dos palestrantes do TEDxRuaPortugal que ocorrerá no próximo de 11 de março no auditório Maria Izabel Rodrigues, na UNDB a partir das 14h.
Com o tema “Propósitos que Movem”, o evento contará com histórias e projetos que estão mudando vidas e concepções em São Luís e no Brasil.
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