Há muitos dias tenho vontade de escrever, porém ando sem coragem de encarar a internet. O lance por aqui só tem piorado. O clima é bélico. Pessoas beligerantes fuçam tudo. Questionam tudo. Têm opinião pra tudo. São capazes de qualquer coisa. E, neste cenário caótico, antagonicamente inflamado por crenças e descrenças, oportunistas surgem em busca de seguidores para legitimar suas correntes ideológicas. A sociedade disciplinar de Foucault já previa que, ao enfraquecer as resistências individuais, o poder legal suprime pela raiz toda voz de dissensão diante das manifestações de arbitrariedade.
A cena hoje é muito pior do que nos anos de 1900. Mesmo assim, como quem caminha atônito pelos escombros após um bombardeio covarde, resolvi falar sobre assunto.
Quando Umberto Eco disse que “as mídias sociais deram o direito à fala a legiões de imbecis”, em 2015, em uma universidade de Turim, claramente atacava esse extremismo cibernético de forma sagaz e direta. O italiano mostrou preocupação com o que via. Eu, cada vez mais entrincheirado, passei apenas a observar. O problema aumenta a cada vez que surgem mais ferramentas de interação social. Ainda nos remotos tempos em que tínhamos à disposição para comunicação em massa apenas rádios, TV’s, jornais, livros e e-mails, grupos ideológicos não tinham tamanho poder de alcance.
O terrorismo religioso/político, causador do genocídio que acontece em grande parte do mundo, tem como incubadora, para muito de seus seguidores, a web. É aqui onde tudo começa. Não tem outro tipo de canal mais eficaz para esta transmissão. Não tem volta. A humanidade vai precisar encarar este problema. Não existe mais espaço para o diálogo. Textos, fotos, memes, gifs e vídeos são vomitados sem nenhum tipo de crivo. Não existe antivírus para bloquear as coisas que fazem mal a outras pessoas.
Aqui, você é livre dentro de um universo pérfido (que envolve perfídia; enganador, traiçoeiro.). Aparentemente ele te inclui em grupos de pessoas semelhantes a você, mas isso é falso. Estão lhe usando. Como nunca, tenho visto republicação de ideias. O ato de “compartilhar” virou uma bomba traiçoeira. Quem constrói o discurso mira como um sniper e acerta na testa do idiota através de cliques. Líderes são forjados. Questionamentos não necessariamente precisam de resposta: é o discurso pelo discurso. Não há análise para quase nada.
A necessidade de ser protagonista seduz. Mas a solidez do debate é fraca. Não cabe muito no texto. O espaço é reduzido e a digestão tem de ser veloz. Quando li a frase: “O computador é burro porque não é capaz de hesitar”, passei a pensar no que mais me afasta desta rede de interatividade. Preciso repensar muita coisa. Mas, também, tenho de preservar a minha individualidade. Em tempo de grupos, fóruns e redes de conectividades, eu me recolho. Não tem sido fácil. Até mesmo o ato de resignar-se é alvo da artilharia. A máquina de fazer soldados não para. A imprensa também tem perguntado menos. A unilateralidade se sobressai aliada a velocidade – não se tem tempo para nada, nem para pensar.
Não proponho como antídoto para esta enfermidade a censura. Não tenho resposta, nem sugestão. Como é bom ter dúvida! Como é bom perguntar!.
UM SOM
Ouvindo Raphão Allaafin e Rincon Sapiência cantando: “Maria, largue as panelas, que hoje tem batuque. A batucada é na sacada”, reflito muito sobre essa parada.
https://www.youtube.com/watch?v=mYfAZiv55dM
Mas e você, o que você tem feito na internet?