Para celebrar o Dia da Consciência Negra, convidamos a Andressa Zumpano, estudante de Serviço Social e Direito, documentarista e militante dos movimentos sociais a publicar seu texto sobre o MOQUIBOM, o movimento social de articulação e resistência quilombola do Maranhão.
Encontro de Tambores no Quilombo do Charco (Foto: Andressa Zumpano)
Estabelecido em um cenário de insurgência dos movimentos sociais frente aos inúmeros retrocessos postulados aos direitos dos povos e comunidades tradicionais no país, o MOQUIBOM se posiciona como importante frente de articulação e resistência para as comunidades quilombolas do Maranhão.
O movimento surge na baixada maranhense, em busca de um novo processo de organização e luta que se baseia no direito ao território livre, bem como de um modelo político-ideológico pautado na emancipação, reunindo inúmeras comunidades quilombolas que estão em um cenário de conflitos e buscam a titulação de seus territórios por vias legais.
Romaria Nacional dos Povos do Cerrado (Foto: Ingrid Barros)
Muito embora a titulação dos territórios seja importante pauta na luta, o movimento busca fortalecer a resistência coletiva de modo a constituir um modelo de organização quilombola emancipatório, com a implementação de escolas quilombolas e exemplos de produção agrícola que possam propiciar a auto-gestão e a independência ao grande mercado, além da valorização de suas práticas culturais como o tambor de crioula e bumba meu boi, que se inscrevem como manifestações identitárias do movimento.
Tambor na Romaria Nacional dos Povos do Cerrado (Foto: Ingrid Barros)
O MOQUIBOM tem em seu histórico, importante participação na resistência dos povos e comunidades tradicionais do Maranhão, especialmente no que tange o combate à violência no campo, utilizando como instrumento de luta a ocupação de prédios das entidades estaduais e nacionais responsáveis pela titulação de territórios, como o INCRA, passeatas por avenidas da capital São Luís, além dos encontros de articulação entre as próprias comunidades, de modo a pressionar o poder público a efetivação de seus direitos.
Encontro de Tambores no Quilombo do Charco (Foto: Andressa Zumpano)
No ano de 2017, observa-se um contexto de profundas ameaças aos direitos das comunidades tradicionais, especialmente, com o trâmite no Supremo Tribunal Federal do julgamento de ações que põe em risco grave os direitos de indígenas e quilombolas, no que tange ao reconhecimento e demarcação de seus territórios: processos referentes ao “Marco Temporal” e a ADIN 3239. Este último visa declarar inconstitucional o Decreto 4887/3003 que regulamenta o artigo 48 da ADCT e tem como objetivo reconhecer regulamentar os direitos sociais e territoriais das comunidades quilombolas, asseguradas pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que põe ao Estado a impossibilidade de negar o autorreconhecimento de povos indígenas ou tribais.
Encontro de Tambores no Quilombo do Charco, em memória de Flaviano Pinto – mártir (Foto: Andressa Zumpano)
Vale ressaltar que a conjuntura de retrocessos aos direitos tem como consequência o agravo da violência contra povos e comunidades tradicionais, que segundo dados da Comissão Pastoral da Terra foram mais de 30 assassinatos entre janeiro e maio deste ano. Assim, a propositura da ação tem forte incentivo da bancada ruralista no legislativo, que sempre se posicionou contra os direitos dos povos tradicionais, provocando uma série de violências e violações, que ameaçam a vida destas comunidades.
“Já chega de tanto sofrer, já chega de tanto esperar, a luta vai ser tão difícil NA LEI OU NA MARRA NÓS VAMOS GANHAR.” – canto de luta
Por isso, as comunidades quilombolas que compõe o MOQUIBOM têm se organizado em encontros para debater estratégias de luta e, sobretudo, celebrar sua cultura que vive e pulsa, em comunidades quilombolas e/ou em aliança com demais povos e comunidades tradicionais: Encontrão da TEIA dos Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão, no quilombo Alto Bonito, Brejo; Encontrão do MOQUIBOM, em Santa Helena, Romaria dos Povos do Cerrado, Balsas e Encontro dos Tambores da Resistência, no quilombo do Charco, São Vicente de Férrer.
Tambor no Encontrão da Teia dos Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão, quilombo Alto Bonito (Foto: Ingrid Barros)
Tais encontros fortalecem o debate sobre os crescentes retrocessos aos direitos dos povos e comunidades tradicionais presentes no governo de Michel Temer, com o grave ataque aos dispositivos legais que dispõe sobre a titulação dos territórios, grande corte de verbas nos órgãos que tratam da titularidade desses direitos e o acirramento da violência no campo com o assassinato de inúmeras lideranças; como também compreender e rearticular os processos de organização das comunidades quilombolas que integram o movimento. A resistência persiste e a luta só tende a crescer.
Noite de Reggae no Encontro de Tambores, quilombo do Charco (Foto: Andressa Zumpano)
Enquanto o tambor aquece, crianças brincam, criando uma relação com a tradição. Quilombo do Monte Alegre. (Foto: Ingrid Barros)
Pequenas coreiras no Encontro de Tambores no quilombo do Charco. (Foto: Andressa Zumpano)
Encontro Nacional dos Povos do Cerrado em Balsas. (Foto: Ingrid Barros)
Crianças na rede. Encontro de Tambores no Quilombo do Charco (Foto: Andressa Zumpano)
Em memória de Flaviano Pinto, Umbico e demais lideranças camponesas que perderam sua vida na luta pelo território.
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Nota do Editor: ADIn é a Ação Direta de Controle de Constitucionalidade, que mediante ação judicial, tem como objetivo questionar lei ou ato normativo que entendem estar incompatível com a Constituição.