Não é gasto, é investimento: Floripa vai às ruas contra cortes na Educação

Estudantes se preparando para as manifestações em prol da Educação brasileira no Ato do dia 15/5, em Florianópolis. (Foto: Ingrid Assis / Equipe SobreOTatame).

A nossa luta é todo dia. Educação não é mercadoria”. Com esse grito a plenos pulmões, estudantes, professores, pesquisadores e pessoas que apoiam a educação do país tomaram as ruas de Florianópolis, ontem (15), no Dia Nacional de Luta em Defesa da Educação.

A articulação começou na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e, ao longo da caminhada pelas ruas e avenidas da cidade, foi recebendo apoio de estudantes e professores de outras instituições como Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC), partidos políticos (PT e Psol) e organizações estudantis, como a União Nacional dos Estudantes (UNE).


Manifestação tomou as ruas do Centro de Florianópolis. (Foto: Ingrid Assis / Equipe SobreOTatame).

No início da tarde, a manifestação se concentrou em frente à Catedral Metropolitana, no centro de Florianópolis. Nem a chuva intermitente atrapalhou a reivindicação dos manifestantes por uma educação de qualidade e pelo desenvolvimento científico brasileiro. A organização do movimento estimou que pelo menos 15 mil pessoas compareceram à manifestação.

Para entender o contexto

No fim do mês de abril, o ministro da educação, Abraham Weintraub afirmou em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo que o MEC cortaria os recursos de universidades que não tivessem desempenho acadêmico satisfatório e promovessem “balbúrdia” nos campi.

As primeiras universidades a receberem a notícia de corte foram a Universidade de Brasília (Unb), a Universidade Federal da Bahia (UFBA) e a Universidade Federal Fluminense (UFF). Vale ressaltar que as três instituições estão entre as 20 melhores do país, pelo Ranking Universitário da Folha, um dos mais tradicionais e consolidados guias da área. Pouco tempo depois, o Ministério da Educação informou que o corte seria estendido a todas as instituições federais.

Sobre os bloqueios das universidades, em entrevista ao SBT, Bolsonaro defendeu que os cortes teriam como objetivo investir na educação básica. Dois dias antes, o ministro Abraham Weintraub publicou um vídeo no Twitter, também, defendendo a mudança de prioridades. “Para cada aluno de graduação que eu coloco na faculdade, eu poderia trazer mais dez crianças para uma creche”, afirmou na gravação. No entanto, na prática, houve bloqueios bilionários, também, nas outras áreas da educação que Bolsonaro havia definido como prioritárias, como a básica e a infantil.

No mês de maio, foi a vez de mais um forte golpe na educação e ciência do país. Foi realizado o congelamento de bolsas da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). O congelamento atingia 4.798 bolsas que não estavam sendo utilizadas no mês de abril, como parte da contenção de gastos federais. Bolsas de doutorado sanduíche de pessoas que já haviam prestado seletivo foram cortadas em 50%, por exemplo.

Milhares de pessoas lotaram ruas e avenidas de Florianópolis. (Foto: Ingrid Assis/SobreOTatame).

Estudantes voltando do doutorado sanduíche estavam com as bolsas Capes congeladas, por causa do fechamento do sistema. Como se percebesse o equívoco, dias depois, o Ministério da Educação afirmou que 1,2 mil bolsas ociosas de programas com alta avaliação seriam reabertas, e que outros 100 auxílios seriam reabertos para doutorandos que estão no exterior consigam concluir suas pesquisas ao voltar ao Brasil. Com isso, o número de benefícios bloqueados cairia para cerca de 3,5 mil.

Panorama Local

Na UFSC, a soma dos valores bloqueados já chega a mais de R$ 60 milhões, cerca de 35% do orçamento de custeio, capital e emendas parlamentares. Estas emendas parlamentares servem, por exemplo, para compra de equipamentos e materiais, ou mesmo para a realização de obras como o do projeto Rota Segura, que construiu um caminho acessível entre a Biblioteca Universitária (BU) e o Restaurante Universitário (RU), no Campus Reitor João David Ferreira Lima, no bairro Trindade.

Manifestantes em Florianópolis. (Foto: Ingrid Assis/SobreOTatame).

A UFSC possui, atualmente, cinco campi, que juntos atendem a, aproximadamente, 70 mil pessoas (professores, técnicos-administrativos, alunos de graduação, pós-graduação, ensino médio, fundamental e básico). Esta queda no orçamento assombra a UFSC desde 2016, ano em que a dotação para investimento (capital) foi de R$ 25 milhões; em 2017, R$ 18 milhões e em 2018, R$ 9 milhões. Para 2019, estão previstos apenas R$ 5 milhões.

Manifestação

É neste panorama de incertezas e de vai e vem em cortes e decisões, que os estudantes e pesquisadores brasileiros se articularam para protestar contra os cortes, neste dia 15 de maio. “Eu acho que hoje é o primeiro recado sobre uma situação de cortes que está insustentável. Esse golpe de 30% em um orçamento que já era insuficiente nos obriga a estar aqui”, frisou a professora de História, Priscila Duwe.

Estudantes, professores e pesquisadores levaram cartazes protestando contra o governo e ressaltando a importância da educação e da pesquisa científica para o desenvolvimento do país. A doutoranda em Antropologia da UFSC, Larisse Pontes, explicou que já teve que realizar modificações em sua pesquisa, por causa dos cortes, para não ter que abandonar a pesquisa e conseguir finalizá-la. “Como alguém que pesquisa dentro da área das humanidades, posso dizer que nós não temos apoio para a pesquisa. Pesquiso a relação do Brasil com outros países, analisando o racismo e não tenho nenhum apoio para isso”, pontuou a pesquisadora, que carregava um cartaz, no qual estava escrito: “Faço pesquisa para mostrar que o racismo continua matando no Brasil”.

Cartazes contaram, também, com críticas ao atual presidente do país. (Foto: Ingrid Assis/SobreOTatame).

Luciana Gransotto, doutoranda do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas da UFSC, também criticou o contexto de incertezas do atual governo e explicou o quanto isso afeta a pesquisa científica do país. “Eu me sinto desestabilizada. Eu acho que independentemente do que venha a acontecer de fato, os cortes reais que venham a acontecer, existe uma instabilidade que se coloca que é muito prejudicial. Nós estudantes, especialmente da pós-graduação, temos que produzir muito. Eu estou prestes a fazer a minha qualificação e isso me desestabiliza. É lógico que estar aqui, nesse coletivo, nos faz ter força e energia para batalhar, mas não tem como não dizer que já existem perdas. As perdas são tanto no nível psicológico como a nível científico também”, ponderou.

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Jornalista por paixão e formação; doutoranda em Jornalismo, pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); e mestre em Ciências Sociais, pela Universidade Federal do Maranhão (UFSC). Fascinada por imagens, lugares e pessoas. Feminista desde criancinha!

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