Duas famílias e um plano perturbador. (Foto: Divulgação)
PS: (Texto com SPOILERS: se não quiser estragar sua experiência, assista o filme e volte aqui!).
Parasita é um filme sul-coreano que vem dando o que falar tanto pela obra em si, quanto pelas premiações que vem ganhando mundo afora. Após sair vencedor no Festival de Cannes do ano passado, premiado esses dias no SAG Awards (prêmio do Sindicato de Atores de Hollywood) e a indicação a melhor filme no Oscar, a obra traz consigo uma mensagem certeira e que bagunça com suas emoções ao passear por gêneros como comédia, suspense e até terror.
Estrelado por um incrível elenco formado por Kang-Ho Song, Woo-sik Choi, Park So-Dam, Chang Hyae Jin, além de Sun-kyun Lee, Cho Yeo-jeong, Lee Jeong-eun e Myeong-hoon Park e tem a direção assinada por Joon-ho Bong, o mesmo que é responsável pelo Expresso do Amanhã (2015) e Okja (2017).
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O longa coreano Parasita traz a história de uma família pobre que tenta levantar uma grana suada preparando recipientes para pizzas, mas tem a vida mudada quando um deles recebe a oportunidade de ser professor substituto de uma família de classe média alta e leva toda sua família para trabalhar junto.
(Ah, um adendo rápido: para trazer um texto conciso e não muito cansativo, vou, a partir de agora, separar o texto por tópicos).
O enredo
Logo nas primeiras cenas do filme, somos apresentados a localização da casa deles, que fica em um espaço abaixo do “nível” da cidade, em que quase que diariamente eles são importunados por bêbados que urinam literalmente na frente da janela da sala.
Além disso, a forma como eles lidam com a rotina e como interagem com o mundo já é de cara o que transmitem suas personalidades e habilidades de cada um. Isso porque, mesmo sem oportunidades, eles conseguem improvisar, assim como se virar, além de possuírem uma inteligência e artimanhas para lidar com a complicada realidade.
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A mudança começa quando o filho da família tem a chance de ser um professor de inglês substituto de um amigo e graças a esperteza da irmã, cria seu diploma e treina como será seu comportamento em sua nova realidade – destaque e atenção para a malícia e expertise de toda a família, em especial da irmã.
Essa expertise gradualmente coloca cada um em uma posição de trabalho na realidade da família rica e até “inocente” (será?), fazendo assim com que cada um ocupe um cargo vital para a manutenção dos privilégios e ordem do seu dia a dia.
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Mas tudo muda com a chegada de uma inesperada visita, mas isso eu conto um pouco mais na frente…
Fotografia e montagem
Indo para um aspecto mais técnico, a fotografia acompanha absurdamente a história, desde como os ângulos evidenciam cada um em cada situação. Como a primeira visita do rapaz que o coloca em um status de superioridade, bem diferente de como ele era mostrado em sua realidade como uma pessoa completamente desassistida.
Esse mérito é magistralmente alinhado com a direção que brinca e beira o absurdo em algumas situações sem parecer forçado, fazendo assim o longa passear por diferentes gêneros, como a comédia, o suspense e o terror.
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Em se tratando de espaços, enquanto a família pobre mora em um espaço apertado e úmido, a família da classe rica goza de um amplo espaço arejado, limpo e com um enorme jardim. O filme contrasta sua paleta de cores também: enquanto na família mais pobre são cores frias e fechadas, a família de classe média alta traz tons saturados, quentes e abertos.
Já sobre a montagem, o diretor Joon-ho Bong é uma pessoa que dá muita atenção para o ritmo de suas obras. Aos 40 minutos de filme, há uma sequência de 60 tomadas que dura quase 5 minutos, o que mostra a dedicação do diretor (nesse link aqui você pode entender melhor essa parte que to falando!). Outra coisa interessante é sua homenagem ao lendário Alfred Hitchcock, tanto por puxar elementos de terror inspirados nele, quanto por um livro que aparece em uma das cenas.
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Este vídeo ilustra um pouco desses elementos que citei acima: dedica a beleza por trás do longa.
Sim, mas o filme é tudo isso mesmo que estão falando? Sim e traz um dos melhores plot twists dos últimos tempos!
Quando chega o ponto de virada da história, em que o plano perturbador da família pobre está a todo vapor, somos apresentados a novas atmosferas, trazendo consigo uma elevação absurda de tensão e até medo: pai e mãe com conflitos, a inesperada visita da ex-governanta que revela que o seu marido bizarramente vive na casa e é o motivo pelo qual o filho do casal rico sofre com convulsões e tenta retratar, em seus desenhos, uma tempestade que revela o brutal contraste entre as duas famílias.
Tempestade esta que faz o espectador entender porquê a família pobre abraçou com todas as forças o plano de ocupar todos os cargos possíveis na realidade da família rica. Nesse momento, a direção e a montagem do filme nos apresenta no que pode-se chamar de buraco que a família vive, retratando uma descida quase que infinita até a chegada ao local que eles chamavam de casa.
Este é um momento em que o diretor Joon-ho Bong merece todo o reconhecimento por sua obra, pois mostra enquanto a classe média alta goza de seus privilégios, mordomias e prazeres sem fazer ideia do que os menos favorecidos passam com falta de saneamento básico, infraestrutura e suporte necessário para recomeçar após uma tragédia.
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E quando você pensa que não poderia vir mais socos no estômago, temos o dia seguinte e caminho para o último ato do filme, em que somos de vez contextualizados a vida de glamour e “dedos” que a família rica vive sem fazer ideia do que se passa com seus empregados ou como foi a última noite deles, culminando em uma tragédia anunciada.
Parasita é um filme que merece toda a atenção e reconhecimento que vem ganhando desde o fim de 2019, por ser um filme fora da rota e do clichê hollywoodiano, que nos brinda com uma história que fácil e infelizmente pode ser retratada em uma cidade latino-americana.
A única ideia de horror que o filme pode ganhar futuramente é: um remake americano.
E você, já viu o filme? O que achou?