Reflexividade em Shingeki no Kyojin: paz ou liberdade?

Eren Yeager, Armin Arlert e Mikasa Ackerman contemplam o mar: o que está além dele? (Arte: Reprodução).

Texto de Aline Alencar, em colaboração ao SobreOTatame.com

Não há consenso acadêmico histórico sobre por quanto tempo a humanidade experimentou períodos de paz. Talvez 100 anos? Sim, se pensarmos em uma relativa paz. Relativa pois, ainda que alguma civilização tenha experimentado algo parecido, em todas as épocas houveram conflitos espalhados pelo mundo.

A história humana é uma eterna luta entre oprimidos e opressores. Aqui, chegamos a mais uma de tantas coincidências com Shingeki no Kyojin (no anime, 100 anos foi o tempo que a humanidade viveu em paz dentro das muralhas).

A série (também chamada de SnK e conhecida como Attack on Titan – e Ataque dos Titãs, na tradução pro Brasil), que no começo parecia apenas ser mais uma sobre apocalipse, mostra-se na verdade uma das obras mais reflexivas dos últimos 10 anos na literatura mundial.

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Em colaboração a esta reflexão sobre SnK, recordo-me como se fosse hoje, em um episódio de outra série, Supernatural, no qual Castiel questiona Dean: você prefere a paz ou a liberdade? À época, me perguntei: e não pode ser os dois? Eu, no alto da minha ignorância e ingenuidade, ainda não entendia que não há a possibilidade de ter ambas e que nesta escolha sempre haverá perdas.

E aí voltamos a Shingeki no Kyojin. Indo para a sua quarta e última temporada em 2020, a série já deixou no ar, no último episódio da 3ª temporada, intitulado “O Outro Lado das Muralhas” (壁の向こう側 / Kabe no Mukōgawa), este mesmo questionamento, só que de forma subentendida. Ao se depararem finalmente com o mar, Eren é o único que não está devidamente maravilhado com aquela “descoberta”, mas preocupado e traz a todo o grupo um choque de realidade:

Eu pensei que do outro lado do mar haveria a liberdade, mas eu estava enganado. Do outro lado, há o inimigo. E se matarmos todos os inimigos, ainda assim iremos ser livres?”. A bofetada moral que eu peguei com estas palavras, somadas depois à música de fundo que sobe junto com os créditos, mais as imagens de guerra e de infinita beleza da natureza misturadas, me fez chorar copiosamente.

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Se eu já era apaixonada pela série, meu carinho aí triplicou. Se eu já via bastante reflexividade sobre a humanidade, aí mesmo que reforçou. Shingeki no Kyojin nada mais é do que a pura reflexão sobre a existência humana e além: o que nos move e porque evoluímos. Não por acaso que sua tradução é Titã de Ataque, o únicos dos 9 titãs originais que se move em busca de liberdade por todos os séculos. Mas se eu pudesse resumir a obra em uma palavra, esta seria Liberdade!

Shingeki no Kyojin 3 - O Mar! - Cena do Ep 22 (Fandublado) - YouTube
Cena do Episódio 22 da terceira temporada de Shingeki no Kyojin (Arte: Reprodução/YouTube).

Não é à toa que, ao avançarmos no enredo, a Tropa de Exploração se torna o corpo central da série, afinal, seu lema e guia é a alcunha de Asas da Liberdade. Desde que foram confinados na muralha, a tropa de exploração tenta achar uma saída para acabar com os titãs fora dela e descobrir o que há além, enquanto muitos se conformam com a vida mediana e até de pobreza extrema dentro das muralhas. E isto, meus amigos, é praticamente uma motivação por instinto!

Muito antes de Eren se alistar ou até mesmo da tragédia com a mãe acontecer, o garoto não era conformado com a vida dentro da muralha. Para ele, era sinônimo de fraqueza, confinamento, covardia em se acomodar. E como a primeira e a última frase do episódio 01, da 1ª temporada, intitulado “Para Você, Dois Mil Anos Depois —A Queda de Shiganshina (1)” — (二千年後の君へ —シガンシナ陥落①— / Ni-sen Nen-go no Kimi e —Shiganshina Kanraku (1)— ), diz: “Neste dia, a humanidade se lembrou da humilhação de viver presa em uma gaiola”.

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Com esta frase, chegamos a mais um questionamento ainda provocado pelo episódio final da terceira temporada: sabendo que a humanidade, instintivamente irá sempre se mover, qual escolha os personagens irão fazer depois desse choque de realidade do Eren?

Sim, porque não há, na vida inteira, como retroceder. A vida sempre segue. É possível retardar o que virá, fugir, mas sempre virá. E, neste caso, virá a guerra entre os que vivem na muralha e os que vivem fora dela. Virá com isto mais perdas, mais sangue. A humanidade novamente provando que não consegue viver em paz.

Mas, seja lá o que aconteça na última temporada, SNK já mostrou a todos a grande estória que é, com sensibilidade, riqueza de detalhes, desenvolvimento completo e humano de seus personagens, ação e, claro, muitas cenas de prender a respiração e se debulhar em lágrimas. Preparados para a Season Finale?


Edit: o texto foi escrito antes do novo trailer (assista abaixo) e parece que muitas das minha suspeitas foram confirmadas. Vem guerra por aí!

https://www.youtube.com/watch?v=r7OmEkdTaa0

A jornalista Aline Alencar (Foto: Arquivo Pessoal).

Nota editorial: o SobreOTatame.com é um site que produz conteúdos de cidadania, comportamento e cultura. Por meio dos conteúdos que publicamos, acreditamos na informação como força de educação e discernimento, desta maneira, abrimos espaço para profissionais que possam tratar de temas mais especificamente.

Aline Alencar é maranhense, nascida e criada em São Luís. Graduada em Comunicação Social, habilitação em jornalismo, pós-graduada em Metodologia do Ensino Superior e divide a vida séria de adulta com música, filmes, animes, séries e com doses de política de boteco para ensandecer. Uma eterna saudosa da MTV dos anos 2000. Twitter: @ahhhline_ / Instagram: @alheeene.

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