Tornando-me mulher com outras mulheres

(Foto: Helena Sbeghen)

Sobre se conhecer e se reconhecer no mundo como mulher

Quando eu e as meninas do Elas SobreOTatame nos juntamos e decidimos que a temática do primeiro bloco seria autoconhecimento e prazer feminino, optei por falar de autoconhecimento. Não muito tempo depois, caiu a ficha de que talvez eu não me conhecesse tão bem assim. Não mais do que coisas simples, como comida e lazer favoritos, estilo de roupa e afins. Percebi que as coisas que importam eu realmente não conhecia. Preciso confessar que isso me rendeu umas crises, lágrimas e ótimas sessões de análise, e também me fez chegar a um ponto que eu até então não havia me dado conta.

Antes de qualquer coisa, gostaria de contar uma história que aconteceu na minha infância e que me fez entender um pouco do motivo de eu não me conhecer. Quando eu tinha não mais que sete anos, as meninas da escola onde eu estudava não me deixavam brincar com elas, nem mesmo encostar em seus brinquedos. Então, elas se fechavam em um círculo e eu, muito sem entender o motivo, ficava de fora, só observando. Talvez porque eu não fosse tão “feminina” quanto elas, delicada e todas essas coisas que muitos esperam que sejamos. Não sei muito bem por quanto tempo durou essa dinâmica, mas lembro bem que os meninos sempre insistiam pra que eu fosse brincar com eles, e eu, já cansada de ficar de fora, um dia aceitei. Desde então, todos os meus amigos mais próximos eram homens.

Sabe o que isso significa? Todos os momentos da minha vida acabei dividindo com homens. Eu falava sobre algumas coisas com eles, mas acabava não falando tudo. Como eu me queixaria de cólica pra alguém que sequer entenderia tamanha dor? Como falaria sobre masturbação quando nossas vivências, de modo geral, são tão divergentes? Enquanto somos constantemente castradas, eles são extremamente estimulados. Eles não entenderiam qualquer dificuldade que eu tivesse comigo, com meu corpo, com meu processo.

Percebi, por conta desse tema, que me tornei indiferente a mim enquanto mulher. Percebi que nunca parei pra conversar com uma mana sobre como me sinto durante meu período menstrual pra saber se sentir tudo aquilo era normal, se ela sentia o mesmo. Percebi que nunca falei sobre masturbação, sobre como era a vida sexual das mulheres que são próximas a mim. Isso tudo, por muito tempo, fez com que eu pensasse que sou problemática demais, diferente demais. Muitas vezes fui dura comigo sem perceber que em boa parte da minha vida tive como referência a vivência e o processo dos homens que me cercavam. A verdade é que eu não falava com mulheres sobre o que nós somos, quem somos, como vivemos, como sentimos.

No meio disso tudo, algumas mulheres da minha vida trouxeram questões a mim. Puxaram assuntos sobre sexo, sobre como eu me sinto, se já tive orgasmos, se me masturbo, se tenho vergonha do meu corpo na hora que vou me despir. Quando não isso, perguntavam quanto tempo dura meu ciclo menstrual, se eu estava de TPM e, pasmem, nem essas coisas eu sabia responder. Algumas delas foram muito importantes nesse processo de tentar me conhecer e enxergar quem eu sou. Entendi que sem parâmetros, eu não consigo me entender. Não posso dizer que sou diferente das outras quando eu simplesmente não as conheço.

A verdade é que não precisamos de muito. Às vezes uma dica basta, uma pergunta que seja. Quando me perguntaram sobre a TPM e eu não soube responder, ela de prontidão me indicou um aplicativo chamado “Flo”, que calcula o período fértil, o ciclo menstrual, o dia da ovulação e tudo que envolve a famosa visita mensal. Foi algo simples, mas que me ajudou muito a me respeitar, compreender meus sentimentos nos dias em que estou mais estressada ou sensível. Eu consegui ser mais paciente comigo e assim cuidar mais de mim.

Muitas de nós já ouviram aquela frase péssima que diz “mulher não tem amiga, tem concorrente”. Ainda que muitas de nós não concordemos com isso, parece que vivemos assim. Muitas vezes não confiamos uma na outra. Muitas não trocam experiências, vivências, opiniões e isso acaba nos distanciando. Simplesmente não nos conhecemos por não conhecermos a outra. Uma mulher que admiro muito me mostrou o trecho de um livro que falava algo como “é quando eu me relaciono que eu existo”. Partindo disso, eu te pergunto: e aí, mulher? Tu existe?

Não esqueça que a troca nos fortalece. Não deixe de falar com as manas à sua volta.

Essa matéria é parte do projeto #ElasSobreOTatame, conheça mais aqui. Durante os meses de janeiro a março, trataremos a temática Autoconhecimento e Prazer Feminino. Acompanhem as nossas redes sociais.

Relembre os outros materiais do projeto:

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Acadêmica do curso de Rádio e TV e apaixonada por música, filmes, séries e podcasts. Defensora das boas ações cotidianas, acredita que a empatia pode salvar o mundo. Só chamar pra bater uns papos aleatórios em qualquer lugar, de preferência que tenha bebida e comida boa.

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